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Família tóxica e sua representação na mídia

Os danos que herdamos dos nossos pais e o ciclo que nunca encerramos.

Olhando para alguns filmes recentes e até mesmo para personagens da mídia geek que eu sou apaixonado, começo a notar uma certa trama que começa a ganhar cada vez mais força e espaço, todas histórias que envolvem no seu cerne, como nossas famílias nos marcam, de forma positiva e negativa. Homem-Aranha, Batman, Viagem de Chihiro, Chinatown, Memórias de Marnei, Sociedade dos Poetas Mortos e até mesmo exemplos mais recentes, como essa nova leva de animações da Disney, todas em algum nível vão demonstrar essas camadas e complexidades que envolvem nossa relação com nossos cuidadores, sejam pais, tios, avós, enfim, essa pessoa que é o nosso guia. E alguns são de forma positiva, eles carregam esperança, recomeço, alegria, amor e todas essas amplas emoções que cuidam de nossas feridas, mas quero focar naquelas que não são tão positivas.

Reprodução: Sociedade dos Poetas Mortos

Como podemos ver com Sociedade dos Poetas Mortos, nossos pais carregam expectativas sobre nós mesmos, desde o momento que nascemos e eles entregam nosso nome, em seu subconsciente, eles assinaram um contrato, idealizando nossas vidas naquele exato momento, imaginando caminhos e sonhos, como vamos ser, nossos gostos e desejos, tudo ao redor que deveria ser um papel em branco, já é colorido, nossas palavras foram roubadas e agora tudo já foi escrito, e olha, não falo que isso seja necessariamente uma má intenção deles, todos criamos expectativas em nossas vidas, é impossível e inevitável, o problema começa quando isso se torna um fardo, uma questão impossível de ser alterada.

Niel, o protagonista jovem de Sociedade dos Poetas Mortos, encontra durante seu processo de amadurecimento, um grande amor pela atuação, pelo palco, aquele momento que esbarramos naquilo que pode se tornar nossa vida, um sonho. Mas seu pai desaprova essa ambição e percebemos todas as consequências que isso gera. Estamos falamos de cortar asas, e que levam para outras questões, como ansiedade e depressão, é esperado uma perfeição em tudo que somos, como encanto representa bem, cada um com seu papel definido e o melhor é sempre o esperado, nunca um erro, nunca um descanso, nunca se perder para poder se reencontrar, somos jovens… estamos constantemente mudando. E nossos pais podem levar isso para uma ofensa, esse ciclo que eles provavelmente viveram, eles devem ter toda uma criação, toda uma caixa de sonhos escondida, tudo aquilo que viveram e não são capazes de mudar, e nossa individualidade se torna um grande perigo, em seu pavor no nosso crescimento, eles carregam uma certeza que vão nos perder e mesmo que não seja uma desculpa para essas amarras, é o desespero deles.

Petite Maman, um filme francês, coloca sua protagonista ainda na infância, para voltar no tempo e conhecer sua mãe na mesma faixa etária, desse modo, podemos notar como essas relações se completam, a relação de sua mãe e de sua avó, são um espelho da sua própria relação familiar, às vezes, estamos no meio de uma linhagem de dores e formas de lidar com situações, que ninguém nunca foi capaz de pensar de forma distinta, que ninguém nunca teve uma oportunidade de fazer de forma diferente e podemos carregar essas marcas para sempre, hábitos que herdamos, gestos violentos, falta de paciência e de compaixão, são pequenas rachaduras que unidas destroem a imagem que criamos, nossa própria visão de quem somos e nos afasta de quem queremos ser. Pois, nessa dor, nesse medo de perder nossa ligação com essa figura, entramos em um ciclo destrutivo para entrar naquele espaço, arrancamos partes nossas, mudamos outras, fingimos sorrisos, nessa necessidade de querer ser aceito e o anseio pelo amor dessa pessoa, acabamos perdendo nosso amor próprio.

Reprodução: Petite Maman

Star Wars, além de toda sua trama política, é também sobre como relações tóxicas moldam nossas próximas ações, todos os seus protagonistas, em todas suas gerações, são afetados por algum tipo de relação tóxica que levou para tal caminho, alguns sendo de um mesmo ciclo, em alguns enredos, notamos como alguns personagens se tornaram vilões por causa da falta de maturidade emocional e apoio dos personagens mais velhos ao redor da história, Anakin desde a infância carregou o título de futuro herói, com até mesmo o sábio Yoda, não ensinando métodos para lidar com seu próprio emocional, uma criança que tinha acabado de ser separado de sua mãe e agora estava aos cuidados de outras pessoas que não deram atenção para quem ele era, apenas para quem ele deveria ser.

Histórias estão sempre retratando o peso de transformar quem somos, em alguém que não reconhecemos, pelos outros que amamos, acabamos escondendo nossos jeitos, nossa sexualidade, nossos sonhos. Somos uma grande mistura, daquilo que vivemos e daquilo que foi entregue, podemos herdar coisas incríveis de nossas famílias, mas também coisas horrorosas, e se torna uma batalha árdua, uma luta constante contra toda essa dor enraizada em tudo que somos, em reconhecer o negativo que é nosso e o negativo que aprendemos, e como lidar com ele todos os dias. Pelo bem da próxima geração, precisamos olhar para nossa própria família, pelo modo que fomos criados e olhar para quem somos, essa pessoa foi gerada pelas nossas próprias escolhas ou pelos gritos e tapas? Uma geração que possa crescer livre dessa dor que vivemos, para isso, é necessário reconhecer a existência dela. Muitas histórias não precisam de vilões, apenas de um filho e seus responsáveis para ter uma trama, algumas histórias mostram que um reconhecimento e um pedido de desculpas pode ser tudo que queremos.

Reprodução: Viagem de Chihiro

Porém, não podemos esperar por tal mudança, não podemos esperar pelo pedido, precisamos viver melhor, precisamos fechar essa porta e não esquecer, mas lidar, vá na terapia, se cuide, se afaste se for necessário. Nossos pais vão morrer e somos muito mais que todo esse dano causado, somos uma pessoa, e mesmo com todas essas cicatrizes, mesmo com todas essas rachaduras, nunca é tarde para vivermos nossa própria vida, para sermos a versão nossa que queremos ser, nunca é tarde para voar.

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