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“Eu não tenho que te provar nada.”

Capitã Marvel e Mulher Maravilha são a abertura das mulheres em um gênero predominantemente masculinos.

 

Desde o século XIX, e especialmente durante o século XX, que as mulheres lutam por reconhecimento e direitos sociais, como estudar, trabalhar e votar. Em todos os aspectos a mulher era vista como inferior e não tinham grande espaço, inclusive na indústria cinematográfica. Na frente das câmeras, elas eram sempre o interesse amoroso do galã principal ou esperando serem salvas por ele, muitas vezes retratadas como personagens rasas, manipuláveis e sexualizadas – e esse quadro nos bastidores não era diferente. Era quase impossível ver uma mulher como diretora ou produtora de um filme – no máximo como maquiadora ou cabeleireira. Com o tempo essa situação mudou um pouco, com mulheres ganhando protagonismo em comédias românticas e tendo maior espaço na produção de filmes, mas ainda é um número muito pequeno. Em 2018, por exemplo, o Center for the Study of Women in Television and Film publicou que apenas 27% dos cargos de diretores, produtores, produtores executivos, roteiristas, editores e diretores de fotografia foram ocupados por mulheres.

Após o boom de filmes sobre super-heróis, a discussão sobre representatividade ganhou força. Houveram sim algumas tentativas de uma mulher no papel principal de um filme do gênero, mas o fracasso de Mulher Gato (2004) e de Elektra (2005) apenas serviu para desmotivar a indústria nesse quesito. As mulheres tiveram então que se contentar com os papéis coadjuvantes em filmes estrelados por homens. Não que elas não mereçam nossa atenção quanto a essas personagens. Scarlett Johansson brilhou como Viúva Negra em sete dos vinte e dois e dois filmes que atualmente compõem o Universo Cinematográfico da Marvel (MCU) ao lado de Elizabeth Olsen como Feiticeira Escarlate, Zoë Saldaña no papel de Gamora, Karen Gillan como Nebula e Gwyneth Paltrow na pele de Pepper Potts. Mas o tempo de cena e até mesmo as falas exemplificam como ainda é reduzida sua importância frente ao protagonismo masculino.

E essas são apenas as que mais de destacam e têm uma relevância maior para os roteiros. Há outras, como Maria Hill, Lady Sif, Valquíria, Lince Negra, Tempestade e Vampira, que não chegam nem perto do potencial que têm nos quadrinhos. Algumas delas, como Maria Hill e Lady Sif quase chegam a ficar meio apagadas nas poucas aparições no MCU. Até dói dizer que outras personagens, como Mary Jane e Jane Foster, foram reduzidas ao papel de mocinha em perigo que sempre espera o herói salvá-las. A primeira vilã bem construída, no entanto, só apareceu em 2017 com Hela em Thor: Ragnarok. Nos filmes da DC, a situação é ainda pior. Lois Lane é quase apagada dos filmes recentes; Arlequina é o ponto alto de Esquadrão Suicida, mas hipersexualizada; Magia teve seu potencial como vilã subaproveitada pelo péssimo filme; Supergirl não ganhou popularidade, mas ainda tem potencial para isso; e Iris West e Felicity Smoak têm papel importância para o Arrowverse, mas acabam pecando ao focarem mais nas relações amorosas e são quase nulas como inspirações para o público feminino.

Com a estreia de Mulher Maravilha em 2017, no entanto, esse cenário está mudando. O sucesso do filme gerou uma grande comoção em Hollywood. Estúdios e produtores viram que filmes dirigido por uma mulher e protagonizado por uma mulher dão certo sim. Petty Jenkins é a primeira diretora a receber um cachê tão alto para dirigir um filme. Foi uma receita de mais de US$ 800 milhões em um projeto que Jenkins correu atrás praticamente sozinha após abandonar o projeto de uma sequência de Thor por “diferenças criativas”. Foi a primeira vez que um filme solo de uma heroína teve uma crítica tão boa (ainda mais sendo da DC, que veio de uma sequência grande de falhas) e fez a Marvel Studios também percebesse que o público quer representatividade. Capitã Marvel chega então sendo o primeiro longa do MCU estrelado por uma mulher. E foi um filme que também deu certo. Apesar das tentativas de sabotagem, ele recebeu 78% de críticos no Rotten Tomatoes e uma receita de mais de US$ 1 bilhão nas bilheterias. Ambos os filmes servem como porta de entrada para mais mulheres como protagonistas.

E há diversas formas de fazer isso acontecer. Kamala Khan pode ser apresentada a partir de Carol Danvers; Tempestade pode ser reformulada no MCU para mais diversidade; Jane Foster pode pegar o manto de Thor na despedida de Chris Hemsworth, como aconteceu nos quadrinhos e já está sendo aderido pelo cinema. Arlequina, apesar de seus pontos negativos, foi destaque em Esquadrão Suicida e protagonizará Aves de Rapina em um grupo formado apenas por mulheres e há uma grande expectativa em torno disso. Viúva Negra finalmente ganhará um filme solo, previsto para 2020. Mulher Maravilha já tem sequência confirmada e Capitã Marvel tem grandes possibilidades também.

O futuro dos filmes de heróis é feminino. Não para ser um rostinho bonito, um alívio cômico ou um mero acessório. Há muitas mulheres que se interessam por produtos assim. Elas demandam maior representatividade nos filmes que consomem (e hoje elas consomem, sim, filmes desse gênero). Elas querem heroínas capazes e autosuficientes, sem que sejam apenas parte de uma equipe majoritariamente masculinas ou para ser o par romântico do protagonista. Elas querem que suas heroínas sejam como Carol Danvers, que derrotou seu vilão e ainda deixou claro que não tinha nada a provar.

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